sábado, 17 de fevereiro de 2018
sábado, 7 de outubro de 2017
BREVE HISTÓRIA DA HERMENÊUTICA ( I ).
BREVE HISTÓRIA DA HERMENÊUTICA ( I ).
Rev. João França
INTRODUÇÃO:
No estudo da Hermenêutica Bíblica
é necessário compreendermos os caminhos percorridos pelos primeiros intérpretes
da Palavra de Deus para a condição da hermenêutica atual.
Neste estudo observaremos uma
breve história da Interpretação com vista à compreensão dos processos e métodos
hermenêuticos existentes na atualidade; pois, somente uma caminhada na história
da interpretação poderá nos auxiliar no caminho a seguir para uma interpretação
segura da Palavra de Deus.
I – A INTERPRETAÇÃO
DO ANTIGO TESTAMENTO.
O Antigo Testamento é o primeiro
documento da Escritura Sagrada a exigir uma interpretação. Quando lemos Neemias
8. Neste trecho vemos que o povo que regressara do exílio babilônico não
compreendiam o que linha na Bíblia, por isso, Neemias e Esdras providenciaram
os Targums que significa aqueles que
explicam o texto.[1] E
assim temos o primeiro processo interpretativo para a comunidade pectual.
1.
A
Interpretação judaica no inicio da era Cristã:
Nos primórdios da era Cristã os
rabinos judeus tendiam a seguir duas abordagens básicas para se detectar o
sentido do texto sagrado.
a)
O Peshar:
É conhecido como o sentido “claro”
ou “simples” que deriva a ideia de sentido literal ou sentido histórico do
texto.
b)
O Remaz: Conhecido
como sentido oculto da lei mosaica[2],
dentro desse conglomerado. Havia também o sentido conhecido como derush termo geralmente usado para
descrever o processo da exegese. O termo pode ser compreendido a partir da
língua hebraica, no uso da palavra vr:*d< (derash)
que tem uma gama de significados entre os quais temos: “tirar informações,
indagar, procurar, buscar, preocupar-se, examinar, inquirir, pesquisar, exigir;
ansiar” [3]
e aqui denota “o estudo intenso, ou exame do sentido de uma passagem”.[4]
2. A Interpretação Rabínica
Na interpretação rabínica
desenvolveu-se grandes coleções de escritos interpretativos que no período
cristão passou a ser conhecidos como o Mishnah,
o Gemara e o Talmude.[5]
Para nossos propósitos didáticos iremos apresentar apenas as regras de
interpretação do famoso rabino Hillel:[6]
Regra 1: Inferência do
sentido mais brando para o mais forte.
Isto seria basicamente o que fazemos em filosofia dentro do silogismo. Partimos da premissa menor (o
sentido mais brando) para uma premissa maior (sentido mais forte). O principio
hermenêutico estabelecido é que aquilo que é verdade sobre o menor é igualmente
verdade para o sentido maior.
P.e. Levando em consideração que o Sábado é mais
importante do que outros dias festivos,
e aquilo que possa ser restrito no dia de Sábado era ainda singularmente mais
aplicável ao dia de Sábado.
Regra 2: Analogia de
expressões: As ambiguidades de passagens bíblicas eram superadas quando se
fazia referências às expressões semelhantes dentro do corpo canônico.
P.e – A passagem de Levítico 16.29 diz que os judeus deveria
afligir a alma no dia da expiação e
forma desse “afligireis a vossa alma” foi interpretada como um abster-se
da comida com base na analogia da passagem de Deuteronômio 8.3 que usa a mesma
expressão em referência ao estar com fome.
Regra 3: Aplicação por
analogia com uma cláusula ou a extensão do específico para o geral.
Um principia geral era construído sobre a base de um
ensinamento contido num versículo.
P.e. O caso de um homicídio culposo (sem a intenção)
conforme descrito em Deuteronômio 19.
Regra 4: Aplicação por analogia com duas cláusulas.
Isto significa que duas cláusulas
bíblicas servem de base para um principio geral. Por exemplo, vemos em Êxodo
21.26-27. Nesta passagem lemos que se um escravo viesse a ter um “dente” ou um
“olho destruído” este mesmo princípio deverá ser aplicado as outras partes do
corpo.
Regra 5: Inferência de
um princípio geral par um caso ou exemplo específico. Essa regra pode ser
usada de duas maneiras – do geral para o específico ou vice-versa.
P.e O que é dito em Êxodo 22.9 – “qualquer coisa” pode ser
aplicado a qualquer coisa que foi tomada por empréstimo e perdida e que deve
ser reembolsada.
Regra 6: Explicação de
outra passagem
O uso de
outra passagem para explicar a primeira passagem com vista a elucidação. Por
exemplo, se o cordeiro pascoal deveria ser abatido caso o dia da páscoa caísse
em sábado? Segundo esse princípio Números 28.10 fala de “sacrifícios diários” e
por isso, o cordeiro deveria se sacrificado para a páscoa não importando o dia
para isso.
Regra 7: Aplicação de
uma inferência evidente por si só em um texto.
Esta regra
lembra que nenhuma declaração deve ser tomada de modo isolado, mas somente à
luz do seu contexto.
II – A INTERPRETAÇÃO
DO NOVO TESTAMENTO.
Neste momento o nosso estudo se
ocupará em lidar com as questões relacionadas com a interpretação
neotestamentária desde a forma como o Novo Testamento interpreta o Antigo até
as avaliações interpretativas deste segundo testamento.
Antes de tudo devemos lembrar que
há “224 citações diretas do Antigo Testamento dentro do Novo Testamento”.[7]
Cristo fez bom uso do Antigo Testamento através de seus ensinos (Marcos 2.25-28
e João 7.23; João 10.34-36).
Paulo também faz bom uso no
Antigo Testamento no Novo Testamento. Vemos ele valer-se de uma alegoria para
referir-se a relação que o Cristão tem com a Lei conforme lemos em Gálatas
4.24-31.
No capítulo 10.1-6 de 1ª
Coríntios encontramos Paulo fazendo aplicação de eventos históricos-redentivos
como uma alusão à Cristo bem como referência ao novo momento que a Aliança se
aplica à igreja. E ainda em Gálatas 3.29 Paulo argumenta que Cristo é o Messias
baseando seu argumento na distinção entre singular e plural da palavra semente
– ou descendente.
III – A INTERPRETAÇÃO NA PATRÍSTICA
Uma fonte bastante
interpretativa na História da Interpretação é certamente os escritos dos pais
apostólicos. Por questões de espaço iremos apresentar, de forma lacônica, as
ideias gerais das escolas de interpretação deste período:
3.1 – A Escola de
Alexandria:
Para esta
escola de interpretação as Escrituras deveriam ser interpretadas alegoricamente.[8]Trata-se
de uma das escolas mais antigas de interpretação.[9]
O pai dessa escola de interpretação foi Clemente de Alexandria, ele “acreditava
que as Escrituras ocultavam seu verdadeiro significado a fim de que fossemos
inquiridores, e também porque não é bom que todos a entendam”.[10]
Virkler lembra-nos que Clemente de Alexandria “ desenvolveu a teoria de que
cinco sentidos estão ligados à Escritura (histórico, doutrinário, profético,
filosófico, e místico), com as mais profundas riquezas disponíveis somente aos que
entendem os sentidos mais profundos.”[11]
O principio da alegorização se difundiu neste período que era quase impossível
um escritor deste tempo não interpretar valendo-se dessa escola.
Ressaltamos
também que o conceito “de que a verdade se encontra alegoricamente oculta além
da letra e da realidade visível”[12]
era dominante neste escola interpretativa, ou seja, o sentido natural e simples
da passagem não era considerado a verdade clara. Vejamos um exemplo da
interpretação alegórica de Gênesis 22.1-4 em Clemente de Alexandria:
Quando, no terceiro dia, Abraão
chegou ao lugar que Deus lhe havia indicado, erguendo os olhos, viu o lugar à
distância. O primeiro dia é aquele constituído pela visão de coisas boas; o
segundo é o melhor desejo da alma; no terceiro a mente percebe coisas
espirituais, sendo os olhos do entendimento abertos pelo Mestre que ressuscitou
no terceiro dia. Os três dias podem ser o mistério do selo (batismo) no qual
cremos realmente em Deus. É, por consequência, à distância que ele percebe o
lugar. Porque o reino de Deus é difícil de atingir, o qual Platão chama de
reino de ideias, havendo aprendido de Moisés que se tratava de um lugar que
continha todas as coisas universalmente. Mas Abraão corretamente o vê à
distância, em virtude de estar ele nos domínios da geração, e ele é
imediatamente iniciado pelo anjo. Por esse motivo diz o apóstolo: "Porque
agora vemos como em espelho, obscuramente, então veremos face a face",
mediante aquelas exclusivas aplicações puras e incorpóreas do intelecto.[13]
Entretanto, o maior expoente da
escola de interpretação alegórica foi Orígenes. Ele “é o membro mais destacado da escola Alexandrina, e é ele quem
afirma de forma mais completa e adequada os princípios da alegorização cristã”[14].
Ele sustentava a ideia de que cada parte da Escritura é alegórica. Ele entendia
que o sentido literal é “valioso, mas algumas vezes obscurece o sentido
primário, que é o espiritual. O literal é para os iniciantes, mas o espiritual
é para os maduros na fé.”[15]
Virkler nos lembra:
Orígenes acreditava que
assim como o homem se constitui de três partes — corpo, alma e espírito — da
mesma forma a Escritura possui três sentidos. O corpo é o sentido literal, a
alma o sentido moral, e o espírito o sentido alegórico ou místico. Na prática,
Orígenes tipicamente menosprezou o sentido literal, raramente se referiu ao
sentido moral, e empregou constantemente a alegoria, uma vez que só ela
produzia o verdadeiro conhecimento.[16]
Esse sistema interpretativo foi construído sobre a
doutrina da correspondência, onde um elemento natural e físico nas Escrituras
(sentido natural claro) é acompanhado de um elemento ou acontecimento análogo à
realidade espiritual.[17]
3.2 – A Escola de Antioquia.
Havia uma escola que se
fazia oposição ao alegorismo alexandrino que ficou conhecida como Escola de
Antioquia. O verdadeiro fundador desta escola foi provavelmente Luciano de
Samosata. Outras acham que fora o Presbítero Diodoro o fundador da famosa
escola. Entretanto, há dois fundamentais representantes desta escola de
interpretação: Theodoro de Mopsuéstia e João Crisóstomo. Virkler sumariza para
nós a distinção entre as duas escolas de forma bastante lacônica:
Teodoro de Mopsuéstía (c. 350—428),
defendiam com o maior zelo o princípio da interpretação histórico-gramatical,
isto é, que um texto deve ser interpretado segundo as regras da gramática e os
fatos da história. Evitavam a exegese dogmática, asseverando que uma
interpretação deve ser justificada por um estudo de seu contexto gramático e
histórico, e não por um apelo à autoridade. Criticavam os alegoristas por
lançarem dúvida na historicidade de muita coisa do Antigo Testamento[18]
Esta escola
rejeitou a interpretação alegórica também fez a distinção entre o gênero
alegórico e a interpretação alegórica; explicou os textos cristológicos do
Antigo Testamento por meio da interpretação tipológica baseada nos padrões
regulares das Escrituras, buscavam a intenção autoral como o sentido natural
das Escrituras[19].
Ressaltamos que os Reformadores se identificaram com esta escola de interpretação.
3.3 - A Escola do Ocidente.
Na
patrística temos uma escola de interpretação ocidental que é conhecida como a
mais eclética (ela vale-se tanto dos princípios dos alexandrinos quanto dos
antioquianos). Segundo Kaiser a importância desta escola se dá exatamente
porque nela se insere a autoridade da
tradição na interpretação bíblica[20]
como algo importante a ser considerado. Os principais representantes desta
escola são Hilário, Ambrósio e, especialmente, Jerônimo e Agostinho.
Agostinho
desenvolveu princípios hermenêuticos importantes em sua obra De Doctrina Christiana. Nesta importante
obra ele ressaltou a necessidade de um sentido literal como sendo a base
essencial para o sentido alegórico. Mas, ele mesmo não hesitou em usar o método
alegórico de forma livre. Quanto uma passegem necessitava deu análise decisiva
ele apelava para a regula fidei (regra
de fé), que de acordo com o próprio Agostinho é conjunto de doutrinas da
igreja. Aqui a tradição começa a ganhar força na interpretação das Escrituras.
Vale ressaltar
que a Bíblia e a tradição (vista como o testemunho da Igreja) devem andar
juntas, nos precisamos ouvir a ambas ou como coloca sabiamente um autor reformado
presbiteriano:
A Bíblia
sozinha seria a religião dos protestantes. O problema e que a Bíblia nunca esta
sozinha. O próprio Calvino, que falou da autoridade da Bíblia nos termos mais
elevados, sempre leu-a e ouviu-a segundo as tradições. Sua revisão litúrgica
foi feita de acordo com as praticas da Igreja Antiga, o mesmo sucedendo com a
organização eclesiástica por ele desenvolvida[21]
Agostinho fez
com que a tradição se avultasse sobre as Escrituras de forma prejudicar a interpretação da mesma. Queremos
deixar claro que podemos ler a Bíblia com as tradições, o problema encontra-se
quando as tradições estão se opondo a Bíblia. A Igreja é a coluna e baluarte da
verdade (1 Tm.3.15). E vivemos uma época em que a historia da igreja (que funciona
como testemunho para nós) tem sido negligenciada, mais uma vez Leith nos
adverte para isso:
Os protestantes
têm sido sempre tentados a crer que, de alguma forma, podem ignorar todos os séculos
da historia crista, estudando a Bíblia sem ajuda e os embaraços dos que os
antecederam. Na verdade, porem, aqueles que se recusam a ler a Bíblia a luz das
tradições da Igreja acabam sendo dominados pelas suas próprias tradições
históricas e culturais[22]
Agostinho
também seguiu, infelizmente, o método chamado de quadriga. Que consistia em compreender que as Escrituras possuíam
um sentido quádruplo:
1. Histórico;
2. Etiológico (uma investigação da origem e das causas); 3. Analógico e 4.
Alegórico. Este método surgiu com João Cassiano sobre a cidade Jerusalém ele
ensinou: Jerusalém literalmente significa
a cidade dos Judeus; alegoricamente Jerusalém é a igreja (Salmos 46.4-5); Tropologicamente , Jerusalém é a alma
(Salmos 147.1-2,12); e, anagogicamente,
Jerusalém é nosso lar celestial (Gálatas 4.26). O próprio Cassiano reconhecer
que o sentido da quadriga não se aplicava a todos os textos das
Escrituras, e enfatizava a busca pelo sentido natural e literal do texto
sagrado.[23]
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS:
1.
ANGLADA, Paulo
Roberto Batista. Introdução à
Hermenêutica Reformada. Ananindeua: Knox, 2006
2. GRANT, Robert.;
TRACY, David. A Short History of the Interpretation
of the Bible USA: Fortress Ress,1984
3.
KAISER JR,
Walter. C.; SILVA, Moisés. Introdução à
Hermenêutica Bíblica. São Paulo: Cultura Cristã, 2009
4.
LEITH, John. A
Tradição Reformada – Uma Maneira de ser a Comunidade Cristã. São
Paulo: Pendão Real, 1999
5.
LOPES, Augustus
Nicodemus. A Bíblia e Seus Intérpretes. São
Paulo: Cultura Cristã, 2004
6. NICOLE, Roger. New Testament Use Of The Old Testament
in: Carl F. H. Henry - REVELATION AND THE BIBLE Contemporary Evangelical
Thought.
7.
SCHWANTES,
Milton. Dicionário de Hebraico-Português
& Aramaico-Português. São Paulo: Vozes e Sinodal, 2003, p.51.
8.
VIRKLER, Henry A.
Hermenêutica Avançada. São Paulo: Vida, 1987
[1] KAISER JR, Walter. C.;
SILVA, Moisés. Introdução à Hermenêutica
Bíblica. São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p.204.
[2] Idem
[3] SCHWANTES, Milton. Dicionário de Hebraico-Português &
Aramaico-Português. São Paulo: Vozes e Sinodal, 2003, p.51.
[4] LOPES, Augustus Nicodemus.
A Bíblia e Seus Intérpretes. São
Paulo: Cultura Cristã, 2004, p.51
[5] KAISER JR, Walter. C.;
SILVA, Moisés. Introdução à Hermenêutica
Bíblica. São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p.204.
[7] NICOLE, Roger. New Testament Use Of The Old Testament in: Carl F. H. Henry -
REVELATION AND THE BIBLE Contemporary Evangelical Thought , p.137.
[8]KAISER JR, Walter. C.;
SILVA, Moisés. Introdução à Hermenêutica
Bíblica. São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p.211.
[9] ANGLADA, Paulo Roberto
Batista. Introdução à Hermenêutica
Reformada. Ananindeua: Knox, 2006 ,p.27.
[10] VIRKLER, Henry A. Hermenêutica Avançada. São Paulo: Vida, 1987, p. 44.
[11] Idem.
[12] LOPES, Augustus
Nicodemus. A Bíblia e Seus Intérpretes. São
Paulo: Cultura Cristã, 2004, p.51
[13] VIRKLER, Henry A. Hermenêutica Avançada. São Paulo: Vida, 1987, p. 44.
[14]GRANT, Robert.; TRACY, David. A Short History of the Interpretation of the
Bible USA: Fortress Ress,1984, p.56
[15] LOPES, Augustus
Nicodemus. A Bíblia e Seus Intérpretes. São
Paulo: Cultura Cristã, 2004, p.132.
[16] VIRKLER, Henry A. Hermenêutica Avançada. São Paulo: Vida, 1987, p. 44.
[17] KAISER JR, Walter. C.;
SILVA, Moisés. Introdução à Hermenêutica
Bíblica. São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p.212.
[18] VIRKLER, Henry A. Hermenêutica Avançada. São Paulo: Vida, 1987, p. 46.
[19] ANGLADA, Paulo Roberto
Batista. Introdução à Hermenêutica
Reformada. Ananindeua: Knox, 2006 ,p.61
[20] KAISER JR, Walter. C.;
SILVA, Moisés. Introdução à Hermenêutica
Bíblica. São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p.214
[21] LEITH, John. A
Tradição Reformada – Uma Maneira de ser a Comunidade Cristã. São
Paulo: Pendão Real, 1999, p. 20
[22] Idem.
[23] KAISER JR, Walter. C.;
SILVA, Moisés. Introdução à Hermenêutica
Bíblica. São Paulo: Cultura Cristã, 2009, p.214.
segunda-feira, 21 de novembro de 2016
IDENTIDADE CONFESSIONAL - A DOUTRINA DA REVELAÇÃO - ESTUDO 01
CURSO DE IDENTIDADE
PRESBITERIANA
CONHECENDO A CONFISSÃO DE FÉ DE
WESTMINSTER.
Rev. João Ricardo
Ferreira de França.
Aula 01 – A Doutrina da Revelação
INTRODUÇÃO:
A confissão de Fé inicia o seu
capítulo de abertura tratando o tema da Sagrada Escritura onde aborda o tema da
revelação de Deus; uma vez que se conhece a revelação que Deus faz de si mesmo
pelas Escrituras se pode de forma clara conhecer mais sobre o ser de Deus.
Nesta aula abordaremos este tema sob
as seguintes proposições: em primeiro lugar, trataremos da revelação
considerada em si e o registro da revelação.
I – A DOUTRINA DA
REVELAÇÃO CONSIDERADA (CFW, I.1)
Nesta seção entramos logo de imediato no conceito de
revelação. O que é revelação? James I. Packer nos apresenta o seguinte conceito
mostrando que “o termo procede do latim “revelare” e significa “tirar o véu” ou “descobrir”.[1]É
tornar claro aquilo que Deus tencionou comunicar ao seu povo, e isto ele faz de
forma deliberada. Quando consideramos este ensino aprendemos que há dois
aspectos da revelação: A Revelação Geral e a Revelação Especial.
1.1
–
A Revelação Geral.
Neste
aspecto Deus se revela por meio das coisas que forma criadas dentro desta
categoria temos a Revelação Geral Imediata, onde Deus, comunica sua vontade
diretamente ao homem implantando a lei. A CFW declara que “a luz da natureza e
as obras da criação” revelam o ser de Deus em seus atributos (bondade,
sabedoria, poder). A expressão “luz da natureza” significa que algo Deus revela
ao homem em sua natureza (Romanos 2.14,15). O quadro abaixo nos ajuda a visualizar este ensino[2]:
O segundo aspecto a ser considerado
é que a revelação Geral também é Mediada, ou seja, ela é comunicada por meio
das “obras da criação e da providência” conforme vemos aqui na Confissão de Fé
de Westminster, a criação prega à existência de Deus (Salmos 19
.1-4). Paulo
Anglada nos lembra que o “universo físico é uma pregação”. [3]A
criação também revela os atributos de Deus (Romanos
1.18-20) este aspecto torna os homens
indesculpáveis diante de Deus.
1.2
–
A Revelação Especial:
A
Revelação Geral não pode levar o homem ao caminho da vida conforme vemos na
Confissão de Fé: “contudo não são suficientes para transmitir aquele
conhecimento de Deus e de sua vontade, necessário à salvação”; então, agradou
ao Senhor em revelar a sua vontade de forma especifica “em diversos tempos e
diferentes modos”.
Esta
revelação especial deu-se nos moldes do Antigo Testamento por meio da revelação
dos profetas que eram modos incompletos da revelação de Deus (Hebreus 1.1-2).
Mas, para “preservar e propagar a verdade” gerando segurança e “conforto da
igreja contra a corrupção da carne e a malícia de Satanás e do mundo” Deus fez
com que esta revelação “fosse plenamente escrita”. A Revelação Especial é a
vontade de Deus encerrada nas Escrituras, é o que está escrito hoje que guia o
povo de Deus (Mateus 4.4,7,10). De sorte, que as Escrituras são “totalmente”
indispensáveis, e por isso, as antigas formas de Deus revelar a sua vontade já cessaram.
Não há mais hoje revelações extraordinárias: línguas, profecias e visões
(Hebreus 1.1-2) sendo a Bíblia suficiente (2ª Timóteo 3.15-17).
II – A NATUREZA E O
REGISTRO DA REVELAÇÃO (CFW I.2)
A segunda seção do capítulo primeiro
da Confissão de Fé de Westminster trata da natureza da revelação especial
(Escritura) e o registro desta revelação conforme encontramos em nossas
Bíblias.
A natureza da revelação é “sagrada”
isto quer dizer que ela é distinta dos demais livros; o apóstolo Paulo relembra
este fato ao escrever em 2ª Timóteo 3.15 que é a sacralidade da palavra que
pode tornar o jovem Timóteo sábio para a salvação. Mas o que aprendemos aqui:
2.1 – Que a Bíblia é
a Palavra de Deus escrita:
Aqui nós vemos que o ensino do
Liberalismo Teológico não se sustenta porque nega que as Escrituras sejam a
revelação especial de Deus, pois, rejeitam os milagres que ali se registra,
isto porque o Liberalismo procura “interpretar, reformular e explicar a fé
cristã dentro de uma perspectiva iluminista”.[4]
Também aqui a CFW se contrapõe à
chamada Neo-Ortodoxia que foi fundada por Karl Barth, ele ensinava que a
revelação de Deus se dava em três esferas: na criação, no querygma [pregação] da igreja e na Escritura – segundo ele Deus
fala-nos por meio de uma Bíblia cheia de erros e contradições. O conceito
barthiano é empirista, pois, a palavra de Deus torna-se tal quando sentimos e a
vivenciamos.
A Escritura é a nossa fonte de autoridade e
não a experiência (Lucas 16.29-31); a Bíblia não se torna ou contém a Palavra de
Deus, ela é a revelação de Deus ao homem.
2.2 – A Revelação
Especial consiste em uma unidade.
A CFW assegura que a Escritura, como
Revelação de Deus, forma uma unidade entre os dois testamentos “incluem-se
agora todos os livros do Velho e do Novo Testamento”. Aqui aprendemos
de imediato que é enganosa aquela ruptura proposta pela escola de interpretação
chamada de Dispensacionalismo que advoga
existir uma distinção ente a lei e a graça, entre o Antigo e o Novo Testamento
A Bíblia de Scofield acentua essa distinção nos seguintes temos:
Que o cristão herda agora as
promessas características dos judeus não
foi ensinado nas Escrituras. O cristão é da semente celestial de Abraão e
participa das bênçãos espirituais da Aliança Abraâmica; mas Israel como nação
sempre terá o seu próprio lugar e ainda receberá a maior exaltação como o povo
de Deus na terra.[5]
Isso implica que se adotarmos a
leitura do Dispensacionalismo estaremos contradizendo o apóstolo Paulo em
Romanos 15.4. O que nos chama atenção na argumentação
paulina é que ele diz “tudo” (o[sa- hosa) nada é deixado de fora; o que “foi
escrito antecipadamente” (proegra,fh
– proegráfê) tem por objetivo o ensino da Igreja. E assim a igreja
neotestamentária é confortada e consolada.
Greidanus comenta o seguinte:
Já que os antigos israelitas e nós
somos um povo da aliança por meio de Cristo, o Deus deles é o nosso Deus, os
antepassados deles são nossos antepassados, a história deles é a nossa
história, e a esperança deles é a nossa esperança. Do mesmo modo, os livros deles são os nossos livros, pois os livros que
Deus tinha pretendido, antes de tudo para eles são “úteis” também para nós (2
Tm.3.16)[6].
Então, devemos rejeitar toda e
qualquer noção de ruptura entre o Antigo e Novo Testamento. Pois, o Antigo e o
Novo Testamento formam a unidade da Palavra de Deus.
2.3
– A Revelação Escrita é nossa Regra:
Ainda aqui nesta segunda seção nós
aprendemos que a regra absoluta é a Sagrada Escritura. A CFW nos diz que a
Palavra de Deus é a nossa regra em duas esferas:
a)
É
nossa regra de fé - os livros inspirados
por Deus nos foram dados para constituírem “a regra de fé”. O que
isto quer dizer? Quer dizer que tudo o que se refere ao culto e a vida
religiosa diante de Deus que tem a palavra final é a Palavra de Deus escrita,
ou seja, a Bíblia. ou seja, tudo o que nós cremos deve ter base bíblica.
Devemos estar fundamentados na doutrina dos apóstolos e profetas: “edificados
sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, sendo ele mesmo, Cristo Jesus, a
pedra angular;” (Efésios 2.20).
b)
A
Bíblia também é a nossa regara de conduta: Ou seja, aqui se ensina que o nosso
comportamento tem que ser moldado pelos ensinos claros das Escrituras. Isto
significa que a nossa ética e moralidade deve ser baseado naquilo que as
Escrituras determinam que façamos; pois, toda conduta que esteja em desarmonia
com as Escrituras deve ser corrigida, tratada e modificada. A Escritura não nos
foi dada apenas para questões doutrinárias, mas também para questões práticas:
“Toda a Escritura é inspirada por Deus e
útil para o ensino, para a repreensão, para a correção, para a educação na
justiça, a fim de que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado
para toda boa obra.” (2 Timóteo.3.16-17 ).
Conclusão:
Neste estudo vimos que a Revelação de Deus se
dá por meio da sua lei que é implantada em cada coração humano neste mundo;
mas, também a mesma revelação é comunicada pelas obras da criação e da
providência; ainda que seja, uma revelação divina não é suficiente para
comunicar a vontade salvadora de Deus; esta vontade redentiva só é comunicada
pela Revelação Especial de Deus conforme se encontra encerrada e registradas
nas páginas da Bíblia Sagrada.
Questionário.
1)
O
que é revelação?
2)
Apresente
a distinção entre Revelação Geral e Revelação Especial?
3)
A
Bíblia é que tipo de Revelação?
4)
A
Escritura é a nossa regra. Mas qual esfera ela é a nossa regra?
5)
Há
novas revelações hoje? Por quê?
6)
O
que revelação Geral Imediata?
7)
Explique
os textos: Hebreus 1.1-2; 2ª Timóteo 3.15-17.
8)
A
Confissão de Fé de Westminster ensina a cessação dos dons? Em que parte?
[1] PACKER, James I. Vocábulos de Deus. São Paulo: FIEL, 2002, p.15
[2] SPROUL, R.C. Verdades Essenciais da Fé Cristã – Caderno 1. São Paulo: Cultura
Cristã, 1999, p.10
[3] ANGLADA, Paulo R. B. Sola Scriptura – A doutrina Reformada das
Escrituras. São Paulo: Os Puritanos, 1998, p.26
[4] COSTA, Herminstem Maia
Pereira da. Raízes da Teologia
Contemporânea. São Paulo: Editora Cultura Cristã, 2004, p.287
[5] Apud, SANTOS, Valdeci S. Anotações
da Bíblia de Scofield sob uma ótica Reformada. In: FIDES REFORMATA, janeiro
– junho, 2000, vol. V, n. 1, pp. 135 – 148.
[6] GREIDANUS, Sidney. O Pregador Contemporâneo e o Texto Antigo –
Interpretando e Pregando Literatura Bíblica. Tradutor: Edmilson Francisco
Ribeiro. São Paulo: Cultura Cristã, 2006, p.211.
DOS CREDOS EM GERAL
DOS CREDOS EM GERAL
Rev. PHILIP SCHAFF, D.D., LL.D.,
Tradução: Rev.
João Ricardo Ferreira de França.
Literatura Geral:
Wm. Dunlop (Prof. of Church Hist. at Edinburgh, d. 1720): Account of all the
Ends and Uses of Creeds and Confessions of Faith, a Defense of their Justice,
Reasonableness, and Necessity as a Public Standard of Orthodoxy , 2d ed. Lond.
1724. Preface to [Dunlop's] Collection of Confessions in the Church of Scotland
, Edinb. 1719 sq. Vol. 1. pp. v.–cxlv.
J. Caspar Köcher: Bibliotheca theologiæ
symbolicæ et catechetiæ itemque liturgicæ, Wolfenb.
and Jena, 1761–69, 2
parts, 8vo.
Charles Butler (R.C., d. 1832): An Historical and Literary Account of the Formularies, Confessions of
Faith, or Symbolic Books of the Roman Catholic, Greek, and principal Protestant
Churches. By the Author of the Horæ Biblicæ, London,
1816 (pp. 200).
Charles
Anthony Swainson (Prof. at Cambridge and Canon of Chichester): The Creeds of
The Church in their Relations to the Word of God and to the Conscience of the
Individual Christian (Hulsean Lectures for 1857), Cambridge, 1858.
Francis Chaponnière (University of Geneva): La
Question des Confessions de Foi au sein du Protestantisme contemporain, Genève, 1867. (Pt. 1. Examen des
Faits. Pt II. Discussion des Principes.)
Karl
Leohler: Die Confessionen in ihrem Verhältniss zu Christus, Heilbronn, 1877.
The
introductions to the works on Symbolics by Marheineke, Winer, Möhler, Köllner, Gunricke,
Matthes, Hofmann, Oehler, contain some account of symbols, as also the
Prolegomena to the Collections of the Symbols of the various Churches by Walch, Müller, Niemeyer, Kimmel, etc., which will be
noticed in their respective places below.
§1.
- Nome e Definição
Um
Credo[1] ou Regra
de Fé,[2] ou
Símbolo,[3] é uma
confissão de fé para uso público, ou uma forma de palavras com autoridade,
certos artigos de fé, os quais são considerados pelos formuladores como
necessário para a salvação, ou no mínimo para o bem-estar da Igreja Cristã. Um
credo pode abarcar áreas inteiras da doutrina e pratica Cristã, ou contém só
alguns pontos que são considerados fundamentais e suficientes, ou que possam
está em disputas. Pode está na forma declaratória ou interrogativa. Pode ser
breve e popular (como o Credo dos Apóstolos e o Credo Niceno), para o uso mais
geral na instrução caquética e batismo; ou mais elaborado e teológico, para
ministros e professores, como um padrão de doutrina pública (Os Livros
simbólicos do período da Reforma). Em segundo lugar, uma Confissão de Fé é
sempre resultado de uma controvérsia dogmática, e mais ou menos direta e
indiretamente uma oposição polêmica contra o erro. Cada símbolo carrega a marca
de sua época e a situação histórica que a fez surgir. Existe um desenvolvimento
na história dos símbolos. Eles assumem mais um formado definitivo com o
progresso do conhecimento teológico e bíblico. Eles são as principais mudanças
e desenvolvimento na história da doutrina Cristã. Eles personificam a fé de
gerações, e a maioria valoriza resultados das controvérsias religiosas. Eles
ainda moldam e regulam o pensamento teológico e o ensino público das igrejas
dos Cristãos. Eles mantém vivos os debates sectários e antagonismos, mas eles
também revelam um acordo subjacente, e prefiguram a possibilidade de uma
harmonia futura.
[1] No
início do Credo dos Apóstolos (eu creio)
o qual o termo é mais aplicado particularmente.
[2]
Kanōn tēs pisteōs ou tēs alētheias (ka,nw/n
th/j piste,ouj ou th/j ἀλήθεια – nota do tradutor), regula fidei, regula veritatis. [NT – regra da fé, Regra da verdade]. Estes são os termos mais antigos
utilizados pelos pais ante-nicenos, Irineu, Tertuliano etc...
[3]
Símbolo, symbolum (do grego sumballein, de jogar juntos, para
comparar) significa uma marca, emblema, palavra de ordem, teste. Foi usado pela
primeira vez com um sentido teológico por Cipriano, AD. 250 (Ep.76 até 69, ad
Magnum, onde é dito do cismático Novaciano, ‘eodum symbolo, quo et nos,
baptizare’[NT – pelos mesmo símbolo, em que tanto nós, fomos batizados], e
em seguida, de forma geral desde o IV século. Foi principalmente aplicada ao
Credo dos Apóstolos como a confissão
batismal pela qual os cristãos poderiam ser conhecidos e distinguidos dos
judeus, pagãos e hereges
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